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Aires do Quintal em Olivença (1519-1551). Grada 166. Francisco Bilou

Aires do Quintal em Olivença (1519-1551). Grada 166. Francisco Bilou
Portal del Espíritu Santo de Olivenza. Foto: Cedida
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Aires do Quintal (c.1490-1551), talvez o melhor herdeiro das inovações tecnológicas deixadas por Andrea Sansovino em Portugal, foi o grande responsável pela pesquisa e exploração mineira do país durante a primeira metade do século XVI.

Para ele foi criado um amplo cargo diretivo até aí inexistente, o de ‘provedor e feitor-mor das minas e metais do Reino’, coincidente com a redação do primeiro código mineiro português (1516), vulgarizado, justamente, com o título de ‘Regimento de Aires do Quintal’.

Operando em quase toda a geografia portuguesa, o novo “feitor-mor dos metais” obteve do rei D. Manuel, a 19 de maio de 1518, “300 cruzados para despeza da fundição, e exame que ha de fazer nas minas de cobre de Olivença, Beja e Moura”, tarefa gratificada logo no ano seguinte com 120.000 réis “pelo exame feito ao cobre de Olivença”.

É esta a primeira referência oliventina ao todo-poderoso feitor que, ainda em 1524, estando a corte em Évora, D. João III lhe conferia especiais condições para “se poderem achar minas e vieiros de aços e ferro”, permitindo-lhe “fazer ferraryas e emgenhos d’agoa e todos os outros aparelhos necesaryos para estes metais laurarem”.

Esta intendência sobre os recursos mineiros do país fez de Aires do Quintal uma figura altamente prestigiada na sua época. Tanto assim foi que o seu nome acabou mitificado nas memórias oitocentistas como o principal arquiteto das obras manuelinas do Convento de Cristo de Tomar, de que a sua própria estátua colocada ‘no frontispício da igreja’ era então uma espécie de garantia autoral. Um equívoco, naturalmente.

Acontece que uma das facetas biográficas menos conhecidas desta importante figura cortesã é a sua presença continuada na vila de Olivença, chegando a ocupar o cargo de provedor da Misericórdia local. A razão mais óbvia que o pode explicar é o facto de Maria da Gama, sua esposa, ser natural desta vila e por conseguinte da linhagem dos Gama de Olivença, à qual se liga Estevão da Gama, pai de Paulo e Vasco da Gama, os navegantes que, em 1498, chegaram à Índia pela rota do Cabo da Boa Esperança.

Apesar desta vivência oliventina até ao final da sua vida (1551), a pouca documentação conhecida dá conta de um permanente conflito de interesses entre o fidalgo e as autoridades locais. Correndo o ano de 1525, D. João III é chamado a intervir a favor do seu ‘feitor mor dos metaes’, que tinha em Benalcaide, na serra de Moxar, junto dos “coutos e coutada do concelho de Olivença”, uma grande herdade, na qual “os lavradores que elle na dita erdade e terras tem sam per muytas vezes avexados pelos rendeiros do verde e oficiais da camara da dita villa”.

Nunca sanado este problema, ainda 1549 o feitor-mor voltava a ser acusado pela “grande afronta e confusão” criada ao povo de Olivença por lhes ter tomado, em benefício próprio, as “aguas concelhias de fontes e poços adquirindoas e contraminandoas”, caso da “agua de São Pedro e a agua do poço de Tinoco”.

E como se isso não bastasse, um dos problemas denunciados em 1525 mantinha-se duas décadas depois: o facto de Aires do Quintal se ter apropriado na “defesa do conselho (de) hum grande pedaço de terra ao pe d’atalaia de moxar”.

As queixas das autoridades oliventinas contra o feitor-mor mantiveram-se até 1549. Escrevendo neste ano à maior autoridade espiritual de Olivença, “o mui ilustre reverendíssimo Senhor D. Jaime de Lencastre, Bispo de Ceuta”, os representantes do povo voltam a acusar Aires do Quintal de ter “agora inventado”, “Deus sabe com que entenção a obra do sprital e igreja do Esprito Santo que he huma igreia de muita devoção e nova”.

A pormenorizada explicação dos procuradores do povo parece convincente e bem fundamentada: “porque não pode aver mais de tres anos que se acabo de muito boa obra com todas as pertenças necesairas coro e sancristia he capela principal e hum portado de canteria muito honrado que custou mais de quarenta mil reis a fazer e por a obra do esprital que ele ora invento não he senão pera fazer muito grandes despezas (…)”.

Neste ano já Aires do Quintal, acossado pelas “grandes brigas”, se ausentara de Olivença, levando consigo os debuxos da ampliação do Hospital, obra extensa e custosa (um conto de réis) que implicava um complicado exercício de financiamento e a indesejada demolição de “seis moradas de casas”.

Deixando de parte a análise às razões de queixa do enorme investimento que o então provedor pretendia fazer, tido por escusado e impraticável pelas autoridades municipais, a sua ida à Corte em 1548 para negociar com o rei os debuxos da obra do Hospital é, na verdade, um bom indicador de qual o seu estatuto mecenático por esse tempo. Razão para nos questionarmos se a sua comitência ficou limitada a este episódio, onde, aliás, era parte interessada, ou este gesto sinaliza algum tipo de protagonismo mais alargado.

De sua iniciativa enquanto provedor é a reforma da igreja do Espírito Santo (Misericórdia de Olivença) e, nomedamente a instalação do portal, que sabemos documentalmente já pronto em 1546. Este “portado de canteria muito honrado que custou mais de quarenta mil reis a fazer” é um bom exemplo saído das canteiras de Estremoz e do mesmo contexto oficinal, por exemplo, do portal da portaria do mosteiro de São Bernardo de Portalegre, datado de 1547.

Mas ao contrário do de Portalegre, esta peça oliventina não parece ter a marca de Pero Gomes, malgrado a qualidade geral do desenho. De facto, a decoração do tímpano com as armas reais portuguesas é trabalho singelo de canteiro pouco qualificado na modelação escultórica.

Seja como for, a Aires do Quintal se deve reconhecer doravante um papel da maior importância na vila de Olivença, não obstante a continuada acrimónia que manteve com os grandes da terra.

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